Michel Sauval - Psicoanalista Jacques Lacan, Seminario "La angustia", Lectura y comentarios de Michel Sauval

Notas y comentarios
Sesión del 23 de enero de 1963

Problemas gerais do acting-out (*)
(General Problems of Acting out)
The Psychoanalytical Quaterly, 1950. vol XIX. Pp 455-467

Phyllis Greenacre

Tomado de http://gymno.sites.uol.com.br/greenacre.htm

Não há muitos escritos sobre o problema do acting-out no curso de uma análise, embora seja algo difícil de lidar, algo que freqüentemente nela interfere, e que pode não ser detectado até que se torne flagrante. Talvez a primeira discussão mais extensa esteja no texto de Freud, “A Psicopatologia da Vida Cotidiana”, sob os títulos “Equívocos na Ação” e “Atos Casuais e Sintomáticos”. O último é particularmente representativo do que ulteriormente foi chamado de acting-out. Naquele momento, entretanto, considerava-se tais ações pelo ângulo de que elementos da situação atual estavam por elas deslocados e nelas concernidos, e dava-se pouca ênfase para o significado das ações em relação à história pregressa do paciente. A descrição mais sistematizada do acting-out talvez seja a de Fenichel, que tenta defini-la como “... uma ação que alivia inconscientemente a tensão interior e traz uma descarga parcial que afasta impulsos (sem que seja importante se os impulsos são expressões de demandas instintuais diretas ou reações a demandas instintuais originais, como sentimentos de culpa, por exemplo); a situação atual, conectada por alguma associação com conteúdo reprimido, é usada como uma oportunidade para descarregar energias reprimidas; a catexia é deslocada de memórias reprimidas para o derivado atual e o deslocamento torna possível esta descarga”. Fenichel nota que esta definição não distingue o acting-out de outra forma neurótica de atividade, e enfatiza que no naquele a qualidade de ação é particularmente manifesta e importante, e que em geral é uma ação bem organizada, e não um mero movimento, gesto ou teatralização. Ele ainda diferencia que por deslocamento e racionalização é geralmente ego-sintônica, e que “... compartilha com a transferência da mesma insuficiência na diferenciação entre passado e presente, uma aversão ao aprendizado, uma prontidão em substituir padrões rígidos de reação por respostas adequadas ao estímulo atual”. O acting-out é, em outras palavras, uma forma especial de lembrança, na qual uma memória antiga é reencenada em uma forma ou mais ou menos organizada, quase sempre sem grandes disfarces. Não se trata de uma lembrança visual ou verbal claramente consciente e nem mesmo há qualquer noção de que tal ação especial seja motivada pela memória. Ao sujeito a ação parece plausível e adequado, embora ao analista e aos que o conhecem soe como desproporcional e inadequada.

Parece haver um entrave na aceitação e no entendimento da realidade corrente na situação do acting-out por:

Também encontramos tais elementos em muitos sintomas e atitudes, mas no caso do acting-out há uma compulsão em reproduzir repetitivamente a experiência integral ou um episódio ao invés de selecionar uma porção ou um índice que a representa. Poderá ser traduzida em novos termos e formas, mas na memória a experiência retém sua organização original em grau considerável.

Fenichel nota a qualidade da mobilidade e da ação que impregna o acting-out, como sua própria denominação já indica. Refere-se a “uma prontidão alopsíquica, talvez constitucional, para agir” como um dos fatores contribuintes, discute o fato de que estar em análise favorece o acting-out utilizado na transferência, que o processo analítico pode por si mesmo, de algum modo, estimular o acting-out em indivíduos predispostos, na medida em que ensina o paciente a produzir derivados cada vez menos distorcidos de impulsos reprimidos, ao mesmo tempo em que mobiliza e provoca todo impulso reprimido. Por tais razões o acting-out é mais comum entre pessoas em análise. Requer precaução a ocorrência de acting-outs fora da transferência, pois isso interfere na análise na medida em que descarrega a tensão em uma via não analisável e por poder criar problemas concretos na vida do paciente, prejudiciais e de longo alcance. Pode ser útil fazer uma diferenciação entre comportamento neurótico e acting-out neurótico. Estão sem dúvida relacionados, mas o acting-out implica em uma ação organizada que geralmente se apóia em uma tendência à ação, especialmente em pacientes mostram numerosas incidências de acting-out durante a análise.

O escopo deste estudo se limita a considerações quanto à origem do acting-out e a sugestões de ordem técnica. Será necessário limitar esta discussão ao habitual acting-out do neurótico em contraste ao acting-out do psicótico, para quem memórias e atitudes inconscientes se apoderam completamente da situação presente, de tal maneira que a estimulação da própria situação fica pouco discernível. Devemos ainda diferenciar o acting-out em situação de análise e o acting-out freqüente, habitual, ou característico de uma tendência evidente de toda uma vida. É evidente que a impulsividade se baseia em uma inabilidade em tolerar frustrações, uma particular perturbação da apreensão da realidade e da autocrítica, indicativo de uma mobilidade e atividade importante e de caráter dramático – o que é bastante característico de neuroses graves, que parecem perigosamente próximas das psicoses e das psicopatias.

Na gênese do acting-out comum, Fenichel menciona a fixação oral, com sua alta necessidade narcísica e intolerância à frustração, a alta motilidade constitucional, a presença de trauma severo e precoce (que produz acting-outs repetitivos e abreativos) como um fator na produção de tendências à ação e contribuinte portanto do acting-out. Considero tais fatores como importantes e a eles acrescento dois outros: uma ênfase particular na sensibilidade visual, que produz uma inclinação à dramatização (derivados do exibicionismo e da escoptofilia) e uma crença essencialmente inconsciente na magia da ação. A necessidade de dramatizar pode ser um dos principais fatores na mudança da atividade neurótico em acting-out, pela predisposição de reter o episódio como uma cena na memória ou pela predisposição a uma memória organizada, ao invés de uma memória com partes que podem ser selecionadas e usadas para repetição. Tais pessoas acreditam que fazer coisas de um modo dramático ou imitativo, para torná-lo crível, é igual a torná-lo verdadeiro. Evidentemente trata-se de se proteger através de atividade mágica, bem como de produzir eventos pela via da imitação.

Pode ser, no entanto, que a situação genética comum que combina ou que produz alguma destas características e a concomitante tendência generalizada à ação consista em uma distorção na relação entre a ação de um lado e a fala e o pensamento verbalizado do outro, que surge na maioria das vezes a partir de sérios problemas no segundo ano, mostrando seus efeitos nos meses seguintes. Repetidas observações clínicas de pacientes que freqüentemente atuam levaram-me a considerar as seguintes relações entre a fala e a ação:

1. mesmo quando a ação que está no acting-out inclui a fala, esta é usualmente secundária à ação, que é a função mais importante. Às vezes a fala em si mesma, através de suas características motoras de timbre e intensidade, parece antes participar da descarga motora de tensão que estabelecer uma comunicação ou o tratamento da situação pelo pensamento.

2. muitos pacientes que freqüentemente atuam na situação analítica, apresentam períodos caracterizados por diversas formas de distorções da linguagem – lapsos, incongruências, trocadilhos, pseudo-afasias, e uma forte tendência ao uso de gíria. Em uma paciente com que pude trabalhar claramente a origem deste distúrbio, o acting-out na sessão sempre se associava com uma preocupação que soava ridícula acerca de nomes próprios, em um jogo sonoro, com várias combinações, do mesmo modo que uma criança de dois explora os sons que podem sair de sua boca. Deste modo a paciente já havia evitado a dor e a ansiedade, aos quatro anos de idade, quando perdeu um primo que faleceu de tétano. Ela destinara a ele investimentos edípicos recusados pelos pais após o nascimento de um irmão mais novo. Muito cedo era levada para passear com sua babá, que a levava para casa e fazia dela uma parceira passiva de cenas sexuais. Era advertida para nada dizer e obteve muito prazer ao manter este segredo. Tal criança, precoce e atraente, predisposta à adulação, falou cedo e claramente, mas, sob a pressão de manter segredo, obtinha prazer de uma tagarelice em que fazia observações espertas, que sem dúvida ao mesmo tempo revelavam e ocultavam o segredo. Parece provável que nesta situação a criança, já neuroticamente afetada, incorporou seu conceito infantil da doença, tétano, dentro de seu jogo repetitivo com palavras derivadas do nome do primo, de efeito gracioso tal que o luto através da identificação tornou-se um jogo atraente e a pedra angular de um distúrbio de caráter. Ela se tornou na vida uma grande comediante, hábil nos trocadilhos e na execução de gags, e sua ação e sua fala serviam para evitar sentimentos.

As diversas formas de associação de sons de palavras, sua relação com o período em que se estabelece a identidade (com a separação entre o self e o mundo externo, e com aceitação da existência de dois sexos), bem como suas conexões com nomes, e sons naturais e funcionais são maravilhosamente apresentadas em um livro infantil, “The World is round” de Gertrude Stein. O exame da psicogênese do desenvolvimento prova que este é certamente um período em que a fala e outras funções motoras, em especial as de locomoção e de ação imitativa, podem ser o ponto de partida para implicações particularmente complexas. É minha impressão que a motilidade do acting-out vem mais daqui que de fontes constitucionais inerentes, pelo menos no sentido de uma constituição congênita. É o período de início e de aperfeiçoamento da fala e da marcha. A oralidade mencionada por Fenichel é de fato importante e já é determinada pela constituição e pelas vicissitudes da experiência infantil individual. É verdadeiro que a frustração oral da criança expressa sua irritação com uma movimentação generalizada e intensa, e que a frustração oral ou formas particulares de indulgência podem produzir uma inabilidade geral de tolerar outras frustrações. É também verdade que a persistência de demandas orais pode ser o foco mais evidente de um estado de tensão emocional generalizado nos primeiros meses de vida, o que é fonte de intensas perturbações que podem ali encontrar sua fonte. O caráter peculiar de algum trauma oral precoce pode ter um papel no atraso, na distorção ou no desvio do funcionamento da fala.

No segundo ano da infância, entretanto, quando se atinge o domínio da fala e da motilidade especializada da marcha, temos que o controle esfincteriano está ainda em vias de se estabelecer. Não é incomum que a fala e os movimentos labiais se combinem ou sejam influenciados por movimentos expulsivos da bexiga e dos intestinos, e o caráter da fala carrega indubitavelmente as marcas de ejeções corporais. O comportamento motor geral, igualmente, é influenciado, mas nem sempre envolvido de um modo inibitório, na luta pelo domínio sobre os processos excretores do corpo. A atividade parece mais aumentar com o esforço de controlar as excreções, e os primeiros comunicados quanto a isso são feitos por gestos e termos infantis, onomatopaicos geralmente, que persistem algumas vezes na idade adulta. Parece-me que nos pacientes com tendência crônica ao acting-out sempre houve:

1. maior ou menor perturbação nos primeiros meses da infância com maior oralidade, menor tolerância à frustração e elevado narcisismo;

2. inibição, atraso ou outra forma de perturbação no desenvolvimento da fala, relativamente maior que a descarga motora, que pode por sua vez evoluir para a marcha e de algum modo assumir a tarefa de comunicar a tensão existente no período de treinamento do asseio pessoal. Entretanto, importa mais o distúrbio da fala na função que na forma. Em alguns casos a criança articula muito bem a fala, mas esta sofre uma degradação com o uso exibicionista em detrimento do uso na comunicação. A ênfase na graciosidade da fala com subseqüente diminuição de seu valor utilitário pode ocorrer tanto com crianças com fala ininteligível como com crianças que falam bem, algumas vezes tomando por base imitações divertidas dos mais velhos. Nos dois casos, a fala é explorada ou amplamente desviada para propósitos diferentes da comunicação. Em outras situações em que pequenas imprecisões da fala são ridicularizadas, uma inibição da fala e uma quase completa dependência da ação podem ocorrer.

Sob certas circunstâncias, há um inevitável aumento no contato pelo olhar. Dra Anna Katan verificou (trabalho não publicado) a importância da repetição da cena primária em influenciar o acting-out. Em sua experiência, a criança que é repetidamente assujeitada a cenas primárias pode ser colocada sob intensa erotização visual pela participação através do olhar, mas não é infrequente que, por chorar, desperte a raiva em algum dos pais e seja levada a participar ativamente. A repetição disto pode aumentar definitivamente os elementos escoptofílicos e exibicionistas do caráter e a atuação pré-verbal que contribuem posteriormente para o acting-out.

Qualquer um que trabalhe com neuróticos graves fica ciente de quanto se expressam com linguagem corporal, seja através de tensão corporal involuntária, gestos, mudanças somáticas transitórias, ou o acting-out. Todas estas formas de comunicação, mesma na situação analítica, são particularmente difíceis de analisar e podem constituir obstáculos para a análise, provavelmente por pertencerem essencialmente a uma forma não verbal de pensamento e representam uma forma real de dificuldade na vida da criança em fazer esta transição. A capacidade de verbalizar e pensar em termos verbais parece representar um enorme avanço não somente na economia da comunicação, mas também na focalização das emoções associadas com o conteúdo do pensamento. Penso que se trata de uma consideração importante a ser feita para compreender os problemas do acting-out.

Enquanto que esta desproporção entre a verbalização e a atividade motora parece ser característica do acting-out mais comum, é patente que sua importância deve variar muito conforme o grau e o tipo do acting-out. Em grande medida é sempre determinada pela pressão do conteúdo que o acting-out expressa, que será reproduzido indefinidamente a medida em que é provocado por estímulos então presentes, como se o sujeito se protegesse do perigo “fazendo em primeiro lugar”, ou repetisse o passado na tentativa de reencontra-lo e provar que ficou menos perigoso, depois que a passagem pelas diferentes etapas do desenvolvimento modelou o sentido da realidade. Aliás, um senso de realidade incompleto parece característico de muitos destes pacientes. Mas uma repetição crônica e habitual de acting-outs é uma repetição de acontecimentos passados e de relações transferenciais com a dependência excessiva do segundo ano de vida, então vividos e experimentados sem o aparato emocional ou métodos de comunicação próprios das fases subseqüentes. Este complexo sintomático se intensifica quando a isso se acrescenta um ego persistentemente fraco e narcisista por outras causas. Na maioria das vezes esta fraqueza narcísica do ego, acompanhada de alta dependência e atividade dramática, ao invés de constituir um esforço dirigido à expressão, associa-se a tendências ao exagero e a uma fantasia desmedida, que por sua vez compromete o senso de realidade ou, no mínimo, compromete a percepção da realidade.

Nos seus primeiros escritos técnicos Freud discutiu a questão do acting-out, em consonância com o desenvolvimento técnico do período (1914) (1), e advertiu contra seu encorajamento: “A repetição durante o tratamento analítico, induzida na nova técnica, evoca um fragmento de vida real, e pode não ser, portanto, sempre inofensiva e indiferente em seus efeitos. Esta consideração revela todo o problema do que é tão amiúde inevitável, a deterioração durante o tratamento... (para o médico) recordar à maneira antiga, reproduzir no campo psíquico, é o objetivo a que adere... Ele está preparado para uma luta perpétua com o paciente, para manter na esfera psíquica todos os impulsos que este último gostaria de dirigir para a esfera motora e comemora como um triunfo para o tratamento o fato de poder ocasionar que algo que o paciente deseja descarregar em ação seja utilizado através do trabalho de recordar”.

Anna Freud, muito depois (1936), resumiu o crescente conhecimento do analista sobre as reações egóicas dos analisandos a partir de observações de acting-outs, mas considerou que sua utilidade para a terapia é muito pequena, já que neste processo “... há pouca oportunidade para deslocamentos endopsíquicos e para colocar o ego sob influências externas, uma vez que este permanece funcionando livremente ou compactua com o id e simplesmente executa suas ordens”. Parece provável que nestas relações está a razão das limitações de métodos como a análise de grupo e a do psicodrama, não importa o quanto possam produzir de alívio a tensões imediatas. Anna Freud conclui que um acting-out não é analisável.

Parece que três técnicas de manejo do acting-out são conhecidas: a interpretação, a interdição e o fortalecimento do ego (Fenichel). São aplicáveis em diversos graus, de acordo com a natureza específica do acting-out, com a estrutura do ego e se este ocorre fora ou dentro do setting analítico. Mesmo com a interdição mais ampla de que nenhuma decisão importante que afete a vida do analisando seja tomada durante o tratamento, a interdição do acting-out não é fácil. A análise se tornaria pouco mais que um guia entre muitas interdições, exigindo-se que o analista fosse astuto o suficiente para antecipar a natureza exata de perigos que o paciente poderia encontrar; aliás, uma vez que a real natureza do acting-out é ego-sintônica e que o paciente não tem noção de sua destrutividade, ele não aparece para o analista antes de sua ocorrência (se aparecer), e por vezes não é comunicado, ou o é de forma indireta.

A interpretação pode parecer o método de escolha, mas é inevitavelmente limitada aos pacientes que possuem o ego razoavelmente bem integrado, aos que atuam apenas esporadicamente e para quem o acting-out se liga à presença de trauma precoces que estão sendo revividos na análise. Em minha experiência, entretanto, a interpretação precoce destes traumas reativa traumas relacionados ou acessórios, e pode colocar em cena uma tendência temporária à ação em pacientes que não a apresentavam. Pode ser portanto uma questão de timing, do mesmo modo que é da justeza da interpretação de um conteúdo específico da memória, a situação infantil conflituosa, núcleo deste distúrbio.

Outro tipo de interpretação é necessário, no entanto, para fortalecer o ego e desenvolver uma autocrítica adequada, que deve preceder ou se sobrepor à análise de conteúdos do id no caso de pacientes que fazem uso amplo e diversificado do acting-out fora da análise. Geralmente tais pacientes revelam tendências assim em suas vidas antes de procurar a análise, seja como comportamento claramente impulsivo, evidente em sua história, seja na restrição generalizada e na inibição com que ocultam e disfarçam a impulsividade latente. Neste último caso, acting-outs aparecem apenas quando a análise avançou consideravelmente. É particularmente verdadeiro em casos de psicose encapsulada na infância. Para estes deve haver um longo período de análise em que se lida com os conteúdos do id apenas quando imprescindível. Muitos deles trazem sonhos criativos e interessantes e parecem possuir um talento para entender o simbolismo. Algumas interpretações que devem ser dadas parecem ser aceitas, mas seu uso será destinado à gratificação narcísica. É mais importante que o narcisismo passe por análise. Os paciente podem seduzir analistas desavisados para trabalhar material profundo, precipitadamente, em um momento onde não existe condição de assimilação por parte do paciente, o que só faz aumentar a ansiedade, fornecendo inclusive a justificativa para acting-outs concretizados ou anunciados, fora do setting analítico. Podem distorcer a interpretação dando-lhe um tom autoritário, ou tomar um sonho como um presságio.

Em um artigo sobre sinais antecipadores de angústia no início do tratamento fiz uma tentativa de descrever meus próprios métodos de lidar com pacientes que demonstram forte tendência ao acting-out. Acrescento ao artigo que os seguintes pontos, de especial importância na questão do acting-out comum, associados a uma pobre estrutura egóica, devem ser mencionados. É particularmente importante que conteúdos do id não sejam interpretados até o estabelecimento de uma transferência positiva, mesmo que já tenham aparecido antes. Parece ser pouco difícil, em muitos casos, obter uma transferência positiva, como no caso de pacientes afetivamente carentes, que rapidamente farão um tipo de transferência imediata mas muito dependente, e que explorarão uma contratransferência de simpatia. Outros mostrarão uma exuberante transferência positiva que se mostrará superficial e que rapidamente se revelará suscetível de comportar acting-outs dentro e fora da transferência. Estes dois tipos de aparente e rápido estabelecimento de transferência positiva requerem um tempo para que ela se solidifique. Alguns deles podem nunca chegar a estabelecer uma transferência firme o suficiente para ser analisada.

A interpretação do narcisismo do paciente deve iniciar-se cedo e deve ser persistente. Entre outros fenômenos narcisistas, são excepcionais a inabilidade de distinguir a fantasia de objetivos realistas e a tácita confiança na magia. Esta por sua vez se mostra em uma linguagem e comportamento particularmente pitorescos (para tornar verdadeiro o que parece verdadeiro), e na supervalorização das coincidências. É relativamente rápido que se consegue mostrar ao paciente sua propensão à ação e o uso disso na evitação da angústia. Com isso é possível despertá-lo para a questão de seu estado básico de tensão, implicada em sua atividade, falsamente tomada como produtiva. Será necessário por um período, nos primeiros meses de análise, confrontar o paciente com evidências destes distúrbios iniciais, manifestos em sua linguagem corporal, atos sintomáticos na situação analítica e no meio externo, menos no sentido de seu entendimento, neste início, do significado completo e detalhado de tal comportamento, e mais de seu uso como meio de comunicação, que subtrai a possibilidade da posse completa de sua capacidade de expressão. Esta provável necessidade, de usar apenas uma abordagem intelectualizada nestes problemas, é feita para que se desenvolva a autocrítica e a auto-avaliação do paciente. Se obtidos, o paciente fará suas próprias interdições e a batalha contra o acting-out estará ganha. Esta conquista se acompanha de uma considerável dor pelos ferimentos e reduções no narcisismo, mas é compensada por um sentimento definido de maior competência, bem recebida pelo próprio paciente. Só depois disso é que a análise do id se desenvolve em sua total extensão.

Resta ainda a questão de quanto dos conteúdos do período pré-verbal, que o acting-out por vezes carrega e representa, pode ser convertido em expressão verbal (pensamento ou fala), e deste modo aliviados. Que é possível mudar o modo geral de expressão do paciente, do acting-out para a verbalização, isso minha experiência clínica o demonstra. Alguns pacientes podem ter de se proteger contra tensões grandes demais para serem toleradas, sem que seja possível o alívio pelo trabalho com os traumas dos primeiros meses, no grau que pode ser obtido quando são traumas ocorridos durante o período de verbalização.

Há uma consideração que se impõe quanto à reação do analista ao paciente que atua. Fenichel menciona que alguns analistas provocam, apreciam ou encorajam ações dramáticas em seus pacientes, e superestimam os benefícios da abreação, mais que de fato os analisam. Parece ser um problema ocasional de analistas jovens e inexperientes, mas pode ser o caso de analistas propensos eles mesmos ao acting-out, de modo direto ou inibido, e apreciam de modo compensatório em seus pacientes. Isso pode ser mais freqüente e importante do que se crê. Pode ocorrer com analistas que não atuam de modo aberto, mas que, como alguns adultos embaraçados, apreciam e aplaudem o comportamento impulsivo dos filhos, que ousam fazer aquilo que eles mesmos não têm permissão para fazer. São atitudes dos pais que estão no fundo de muitas psicopatias com impulsividade. Uma atitude ansiosa por parte do analista diante do acting-out é com freqüência percebida e respondida pelo paciente, que tem assim seu sadismo inconscientemente gratificado, como já havia sido no próprio acting-out, conferindo um falso senso de poder e independência. Uma questão final, que pode apenas ser colocada, é a relação do acting-out com a conversão histérica. É óbvio que o acting-out é muito comum como sintoma na histeria. O diagnóstico é feito com menos freqüência ou porque atualmente a neurose já não aparece tanto ou porque tendemos a ver nisso um conjunto maior de distúrbios mais profundos, e tendemos a agrupar estes casos como neuroses narcísicas. É um tema válido para estudo adicional.

Tradução de Carlos S Martinez

Abril de 2004


(*) A presente tradução poderá sofrer revisões brevemente, e está disponível, nessa condição, em função de seminário em andamento. (NT)

(1) Recordar, Repetir e Elaborar (Novas Recomendações sobre a Técnica da Psicanálise II), Sigmund Freud, Vol XII, pp 198 e 200, 2a. Edição, Standard, Ed Imago.

Vover a la página principal